sexta-feira, 20 de março de 2009

Mágicos Presentes




"Cresci ouvindo minha mãe dizer, nas adversidades: “Não tem tu, vai tu mesmo”. Esta fé era de cortar o coração da gente. Dela vinha a magia da surpresas nas datas de aniversário e Natal. Por mais difícil que fosse a situação financeira, ela sempre se esmerava em conseguir um presente cujo valor estava na surpresa. Cada vez que conto esta história para meus filhos, não consigo segurar o choro, pois me encho de saudade da criatividade de minha mãe, que nada mais era, que variação do seu imenso amor.
Perto de nossa casa morava uma costureira que se chamava Maria Luiza. Mesmo nome que o meu. Ela e o marido não tinham filhos. A casa era uma beleza em plantas. Era uma floresta de samambaias, helicônias, begônias e, as minhas preferidas, gloxínias. Eu gostava muito dela, e ela de mim. Eu aprendia noções básicas de costura. Pegava uma camisa velha de meu avô, tirava os botões, costurava na frente, e dava mil voltas com elastex para ficar coladinha. Era moda. Em uma tarde, fabricava uma blusa nova, graças a D. Luiza, como eu a chamava.
Um dia ela propôs que a ajudasse como modelo, para uma blusa que faria à sobrinha distante. “Ela tem o teu tamanho e eu queria fazer uma batinha. Comprei este tecido.” Eu adorei. Era um floreado com motivos psicodélicos de fundo branco com flores laranja e verde, sempre gostei de laranja e verde. E num saquinho de papel pequeno, um montinho de trancelim cor de laranja para os acabamentos.
Aquelas duas semanas de final de outubro e início de novembro, foram de provas. Eu chegava da escola, almoçava e ia pra casa da D. Luiza costurar e experimentar a bata. “Mãe, a D. Luiza ta fazendo uma bata tão linda! É para uma sobrinha que mora longe. Ela quer mandar um presente e eu tô experimentando. Ela disse que a guria tem o meu corpo”. Minha mãe sorriu dum jeito tão discreto que eu não notei nada, simplesmente seguiu lavando a pilha de louça dos cinco pirralhos. Pensei: “Ela nunca dá bola pras minhas conversas”. Então, nem falei do meu aniversário. Sabia que não poderia pedir nada, mas já estava feliz com o dinheiro que meu avô daria para comprar livros na Feira em Porto Alegre, que até hoje coincide com o meu aniversário.
Cinco de novembro. Faltava pouco para o dia nove, meu dia. D. Luiza concluiu o trabalho. “Mãe, a batinha ficou tão linda. Sabe que eu gosto da D. Luiza, mas tive uma invejinha”. “Que feio Mana. Ela é tão boa pra ti”. Virou as costas e foi correndo atender o padeiro que entregava o pão de porta em porta, pago por mês.
Meu aniversário amanheceu com sol e um ventinho normal em novembro. Como sempre, enquanto minha mãe viveu, foi a primeira a me felicitar. “Feliz aniversário Mana. Tudo de bom minha filha”. E me deu um pacote. Há esta hora já é possível adivinhar. Não tenho o traquejo dos escritores de suspense pra ter enganado o leitor que sabe o que aconteceu.
Abri o presente. Ali estava a batinha. Laranja e verde, com o trancelim laranja no acabamento das mangas balofas e na golinha redonda. Enchi-a de abraços e beijos. “Tu me enganou bem direitinho. Nem imaginei que a batinha era pra mim”.
Esta era minha mãe. Uma mulher nascida da adversidade, mas cheia de amor."






(by Malu Soares)






Esta era MINHA avó! :)
muita saudade dela!

É. Mais um texto aqui que não é meu :P . Autoria??! Não vão querer que eu entre nessa discussão aqui, né!?

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